Como equilibrar recursos digitais e experiências presenciais para formar leitores críticos e curiosos desde os primeiros anos.
A alfabetização nunca foi um processo isolado; ela sempre refletiu os contextos sociais, culturais e tecnológicos de cada época.
No século XXI, esse pano de fundo ganhou novas e complexas cores: crianças crescem cercadas de telas, estímulos interativos, aplicativos e vídeos.
O desafio não é apenas ensinar a ler e escrever, mas garantir que essa aprendizagem seja profunda, crítica e prazerosa em meio a distrações digitais.
Lilian Bacich, especialista em metodologias ativas, afirma que “as tecnologias digitais não substituem o papel do professor; ao contrário, potencializam a mediação quando utilizadas com intencionalidade pedagógica”.
O educador, então, precisa transformar a tecnologia de um possível adversário em um grande aliado.
Os riscos da superficialidade e o papel do educador
Com o volume de informações circulando nas mãos das crianças, um risco iminente é que a alfabetização se torne rasa: ler fragmentos rápidos, consumir conteúdos superficiais, sem aprofundamento e reflexão.
Clóvis de Barros Filho alerta que “excesso de estímulo sem filtro pode gerar dispersão e não conhecimento” — e é aqui que o papel do professor se mostra ainda mais essencial.
A alfabetização não é apenas técnica; ela exige tempo, paciência, apropriação dos símbolos, experiência com o texto literário, conversa olho no olho, partilha de sentidos.
Livros impressos, jogos de palavras no quadro, leituras coletivas continuam insubstituíveis.
Ao mesmo tempo, recursos digitais abrem portas criativas: vídeos animados, aplicativos de leitura e escrita, jogos narrativos, podcasts infantis e plataformas interativas são ferramentas que podem enriquecer o processo, quando bem orientadas.
O desafio do equilíbrio: experiências que funcionam
Uma prática eficaz é integrar momentos de leitura física com atividades digitais. Por exemplo, depois de uma roda de leitura em sala, os estudantes podem criar ilustrações em aplicativos ou produzir pequenos áudios contando o que entenderam da história.
Jornais e revistas digitais, projetos de criação de livros colaborativos online, desafios lúdicos de soletração e até pesquisas guiadas na internet — tudo isso pode ser organizado para motivar e dar sentido ao conteúdo.
Segundo José Moran, “a escola contemporânea ganha quando promove vivências híbridas e dinâmicas, conectando diferentes formas de linguagem e expressão”.
Nessas estratégias, cabe ao educador provocar a reflexão: “Onde mais vemos essas palavras? Quem escreveu esse texto digital? Como decidimos se uma informação online é confiável?” Assim, ensina-se, desde cedo, o valor da análise crítica frente à abundância de dados.
Família e rotina digital: orientação é o segredo
No ambiente familiar, o uso das telas deve ser canalizado para momentos de interação, pesquisa conjunta, descoberta de novos temas e construção do hábito de leitura em diferentes plataformas.
A família pode compartilhar leituras em tablets, ouvir histórias em áudios, visitar bibliotecas virtuais junto com a criança, mas também estabelecer limites saudáveis para o consumo individual.
Içami Tiba reforça a importância do diálogo e orientação constante: “Telas não substituem o tempo de olho no olho; são apoio, não pilar”.
Alfabetizar para o mundo conectado
Alfabetizar na era digital requer ousadia e discernimento. Professor e família desempenham juntos um papel fundamental: apresentar livros, instigar a imaginação, guiar escolhas, selecionar conteúdos e mostrar que ler — seja no papel ou na tela — é sempre uma forma poderosa de enxergar o mundo com mais clareza.
Ao equilibrar tecnologia e vivências presenciais, a escola cumpre sua missão de formar leitores críticos e criativos, capazes de ir além do superficial e encontrar prazer nas possibilidades infinitas das palavras.
Referências:
Bacich, L. (2015). Metodologias Ativas para uma Educação Inovadora.
De Barros Filho, C. (2019). A Vida Que Vale a Pena Ser Vivida.
Moran, J. (2017). A Educação Que Desejamos: Novos Desafios e Como Chegar Lá.
Tiba, I. (2011). Educação Familiar: Novos Rumos.