O papel do professor mediador nas interações infantis

O papel do professor mediador nas interações infantis

Como a presença, o olhar atento e a escuta sensível do educador são decisivos para a formação de vínculos, a aprendizagem e a construção de uma infância democrática.


A mediação do professor: muito além de ensinar conteúdos


A Educação Infantil do século XXI rompeu de vez com a figura do professor como mero transmissor de saberes.

O papel do educador, hoje, é múltiplo, refinado, estratégico: é presença cotidiana, é olhar que observa para além do momento aparente, é mão estendida para lazer, criatividade, solução de conflitos e construção coletiva do conhecimento.

Mais do que ensinar “o que fazer”, o professor-mediador ensina “como viver com e entre outros”, criando oportunidades para que as crianças se expressem, criem laços e edifiquem sua autonomia.

Loris Malaguzzi, idealizador da abordagem de Reggio Emilia, afirmava que “a função do educador é ativar possibilidades, criar contextos de experiência e ser parceiro das cem linguagens da criança”.

No ambiente escolar, o mediador é aquele que escuta, acolhe, interpreta, desafia e apoia cada pequeno em sua singularidade, respeitando o tempo e as potencialidades do grupo.

O professor como mediador: fundamentação nos grandes pensadores


O conceito de mediação ganha força em diversas correntes pedagógicas.

Vygotsky, em sua abordagem sociocultural, destacou o papel do outro – adulto ou par mais experiente – como ponte entre o que a criança já sabe e o que pode alcançar. Por meio de encorajamento, questionamentos e intervenções pontuais, o professor amplia as “zonas de desenvolvimento proximal” da criança, tornando possível vivências ricas e desafiadoras que consolidam aprendizagens e valores.

Maria Montessori já dizia que “o professor não é aquele que ensina, mas aquele que inspira, provoca e sustenta a autonomia”. Em sua metodologia, o papel do mediador está em preparar o ambiente, observar silenciosamente, apoiar dificuldades sem interferir no protagonismo da criança.

Piaget entendia que a ação do educador deveria provocar o conflito cognitivo: apresentar desafios, suscitar perguntas, formular propostas que levem a criança à reflexividade, à descoberta e à reconstrução de hipóteses sobre o mundo e sobre si mesma.

Froebel valorizava o educador como jardineiro de potências: cultiva, poda quando necessário, prepara o solo e assegura que cada semente – com seu tempo e potencial único – possa florescer em companhia das demais.

Malaguzzi, Gandini e Forman, inspirados por Reggio Emilia, trazem o professor como pesquisador, documentador e co-construtor da cultura da infância, valorizando tudo que a criança manifesta no brincar, na fala, na arte, no experimentar.

As múltiplas dimensões do professor-mediador na prática


O professor-mediador atua em vários planos simultâneos:

Na promoção das interações: cria rodas de conversa, brincadeiras coletivas, projetos colaborativos e situações de escuta dos diferentes, investindo numa cultura democrática, inclusiva e afetiva.


Na resolução de conflitos: intervém com ética, paciência e humildade, transformando as disputas cotidianas em oportunidades de aprendizagem socioemocional.


No estímulo à criatividade e investigação: provoca perguntas, apresenta novos materiais, desafia hipóteses, propõe problematizações e valoriza cada resposta (ainda que incompleta ou inesperada), inspirando a pesquisa, a dúvida e a criação.


Na construção da autonomia: permite escolhas reais, apoia decisões, incentiva a experimentação e legitima o erro como parte do desenvolvimento. Como destacava Montessori, “a maior vitória é o pequeno crescer por si só, com confiança e desejo de explorar”.


Na valorização da cultura da infância: documenta, expõe, compartilha com as famílias e a comunidade o cotidiano das crianças, tornando visível a riqueza dos processos e das pequenas conquistas diárias.


Ser mediador em uma escola plural e democrática


Nas escolas inclusivas – inspiradas em Reggio Emilia, na BNCC e nas boas práticas brasileiras –, a mediação do professor é chave para garantir que todas as crianças experimentem pertencimento, respeito e visibilidade. Isso se expressa em ações concretas:

  • Observação sensível do grupo e de cada indivíduo, reconhecendo ritmos, interesses e necessidades especiais.
  • Criação de ambientes seguros, ricos em estímulos, onde todos possam se expressar por múltiplas linguagens (pintura, música, movimento, palavra, tecnologia).
  • Apoio à cultura de assembleias, eleição de projetos coletivos e valorização das diferentes vozes e culturas presentes na turma.
  • Incentivo ao diálogo constante com as famílias, compartilhando conquistas, desafios e protagonismos infantis.

Como reforça Gandini, o professor-mediador é aquele que “faz junto”, sem infantilizar ou colonizar a experiência das crianças, mas também sem abdicar da responsabilidade de apoiar, organizar, conectar e inspirar.

O legado do professor-mediador: infância potente, cidadão preparado


Ao mediar relações, brincadeiras, saberes e emoções, o professor tece os fios da infância potente: aquela em que a criança se percebe autora, capaz, apoiada e desafiada.

Esse legado não forma apenas bons estudantes, mas cidadãos sensíveis, autônomos, prontos para participar e transformar uma sociedade plural e democrática.

Referências

Vygotsky, L. S. (1991). A formação social da mente.
Montessori, M. (2017). A criança.
Piaget, J. (1998). O julgamento moral na criança.
Froebel, F. (1981). The Education of Man.
Malaguzzi, L. (1999). As cem linguagens da criança.
Edwards, C.; Gandini, L.; Forman, G. (1999). As cem linguagens da criança.